O presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados desde 2019 falou à Advocatus sobre a CPAS, o protocolo com a AIMA, as defesas oficiosas e faz um balanço do seu mandato.
Licenciado em Direito desde 1994, ano em que concluiu a licenciatura, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Inscrito na Ordem dos Advogados pelo Conselho Distrital de Lisboa com a cédula profissional desde 19 de fevereiro de 1997.
Em 2004 tornou-me sócio fundador da ATMJ. Mestre em Direito em 2006, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa manteve uma carreira académica durante cerca de 17 anos, como docente universitário na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, na Universidade Lusófona e na Universidade Moderna.
Ligado ao Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados desde 2011. Primeiro, como Vogal-Tesoureiro do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, para o triénio 2011-2013, e, nos dois mandatos seguintes, como Vice-Presidente responsável pelo pelouro da Formação, nos triénios 2014-2016 e 2017-2019. Em novembro de 2019, foi eleito Presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados. Mandato que foi renovado há quase dois anos.
Acabou de rejeitar a proposta de pagamento de senhas de presença do CG. Foi apenas uma manobra política ou considera mesmo que a OA está com problemas financeiros?
A decisão de discordar do pagamento de senhas de presença pelo Conselho Regional de Lisboa resulta de uma análise ponderada e cuidadosa e de uma preocupação real com a sustentabilidade financeira da Ordem dos Advogados. Aliás, como ficou bem demonstrado nos números destacados no nosso comunicado. Enquanto presidente do CRLisboa, manifesto a preocupação do CRLisboa relativamente ao futuro do equilíbrio financeiro da OA, considerando diversos fatores: a redução significativa nas inscrições de Advogados-Estagiários e, consequentemente, nas novas inscrições de Advogados, o aumento de despesas com a aquisição de novas instalações no valor de 3,4 milhões de euros e a criação de novos órgãos remunerados e a remuneração dos órgãos existentes, conforme previsto no novo Regulamento de Remuneração, Compensação e Senhas de Presença.
Esta convergência de desafios e riscos ameaça não apenas a estabilidade financeira da OA, mas também a sua capacidade de cumprir eficazmente no futuro a sua missão institucional. É fundamental sublinhar que representar os Advogados que nos elegeram é uma honra e essa deve ser a nossa principal recompensa. O espírito de missão e o compromisso com a Classe devem orientar a nossa ação, não a expectativa de compensação financeira. Continuaremos a trabalhar para garantir a estabilidade financeira e o futuro da nossa instituição, sempre em defesa dos interesses dos Advogados e da Justiça.
E a medida de que advogados ajudam a tratar de processos administrativos na AIMA?
O protocolo que prevê a participação de Advogados no tratamento de processos administrativos na AIMA é problemático e representa uma ameaça à dignidade da Advocacia. O Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados opõe-se a este protocolo, uma vez que considera o valor de 7,50 euros por processo absolutamente inaceitável, e que este representa uma grave desvalorização do trabalho jurídico especializado.
Este montante não cobre sequer os custos básicos associados ao exercício da profissão, muito menos reflete a complexidade e responsabilidade inerentes a estes processos.
Os Advogados são chamados a realizar tarefas de elevada responsabilidade e complexidade, incluindo análise documental, promoção de audiência prévia e elaboração de propostas de decisão administrativa, tudo isto por um valor que não cobre sequer duas horas de estacionamento em algumas zonas de Lisboa.
Ao atribuir um valor tão baixo a estes serviços, transmite-se a mensagem de que os direitos e a situação legal dos imigrantes são de pouca importância, o que é inaceitável num Estado de Direito. Este protocolo não só compromete a dignidade da Advocacia, mas também põe em causa os princípios fundamentais de justiça e equidade que jurámos defender.
A Ordem dos Advogados tem o dever inalienável de recusar veementemente qualquer iniciativa que desvalorize de forma tão flagrante o trabalho dos Advogados e possa comprometer a qualidade dos serviços jurídicos prestados. É nossa obrigação defender intransigentemente a dignidade da profissão e a excelência dos serviços jurídicos, pilares fundamentais do Estado de Direito e da Justiça. Devemos trabalhar para encontrar soluções que permitam uma colaboração construtiva com entidades como a AIMA, mas sempre em termos que respeitem o valor e a importância do trabalho jurídico especializado. A Advocacia não é apenas uma profissão, é um pilar fundamental do Estado de Direito, não podemos permitir que seja tratada como um serviço low cost.
Este MJ tem sido pouco favorável à classe da advocacia?
Começaria por dizer que, como é natural, devemos dar o tempo necessário para que o novo elenco do Ministério se inteire dos temas e comece a atuar. Nesta fase inicial, no que constitui um bom augúrio, o atual Ministério da Justiça tem demonstrado uma postura que, embora ainda aquém das necessidades da Advocacia, apresenta alguns sinais positivos, face a uma realidade histórica em que existia um certo “alheamento” do Ministério em relação aos Advogados e aos desafios que enfrentamos.
No entanto, é importante reconhecer que há desenvolvimentos em curso que podem representar um passo na direção certa. O Ministério da Justiça iniciou um processo de atualização da tabela de honorários no Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais (SADT). Este é um passo importante, há muito aguardado pela classe, e um reconhecimento da necessidade de valorizar o trabalho dos Advogados no âmbito do apoio judiciário, um pilar fundamental para garantir o acesso à justiça para todos os cidadãos. Esperamos que este processo seja concluído de forma favorável para os Advogados, reconhecendo adequadamente o valor do nosso trabalho e a importância crucial do acesso à justiça para todos os cidadãos.
Permanece a necessidade urgente de rever as alterações desfavoráveis introduzidas nos Estatutos da Ordem pela anterior maioria parlamentar, as quais representam um retrocesso para a classe e para a proteção dos direitos dos cidadãos.
Até ao momento, não houve iniciativas concretas para revogar ou alterar significativamente estas mudanças prejudiciais. Entendo que ainda há espaço para melhorar o diálogo entre o Ministério e a Advocacia. Questões cruciais como a reforma do sistema de previdência dos Advogados e a melhoria das condições de acesso à justiça para a classe média continuam a aguardar respostas adequadas. Como tenho defendido consistentemente, a dignidade da Advocacia é inegociável. Continuaremos a acompanhar de perto o processo de revisão da tabela de honorários, lutando para que o resultado final reflita verdadeiramente o valor e a importância do trabalho dos Advogados no sistema de justiça.
Ao mesmo tempo, manteremos a nossa posição firme na defesa da revogação das alterações estatutárias prejudiciais e por um reconhecimento adequado do papel fundamental que os Advogados desempenham na sociedade e na defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
É fundamental que o Ministério da Justiça continue a avançar neste caminho de diálogo e reconhecimento da Advocacia, não apenas no que diz respeito à tabela de honorários, mas em todas as questões que afetam o exercício da nossa profissão e o funcionamento do sistema de justiça como um todo.
E a questão da CPAS? Ficará resolvida ainda durante este mandato do CG?
O atual Ministério da Justiça tem demonstrado uma postura que, embora ainda aquém das necessidades da Advocacia, apresenta alguns sinais positivos em relação à questão da CPAS (Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores). O Ministério da Justiça criou uma comissão presidida pelo economista Carlos Tavares para avaliar o modelo de segurança social dos Advogados e Solicitadores. Esta comissão, que inclui representantes de várias entidades e especialistas, irá estudar e propor ao Governo a melhor solução para os beneficiários da CPAS. A comissão irá considerar diversos cenários, incluindo, nomeadamente, a plena integração na Segurança Social, a criação de um regime optativo ou a manutenção da CPAS com melhorias.
O Governo determinou uma auditoria à CPAS, a ser realizada pela Inspeção-Geral de Finanças, para apurar o seu património, encargos e responsabilidades futuras, a qual é fundamental para fornecer uma base sólida de informações para a tomada de decisões e para sairmos do campo dos “achismos” e da demagogia. Como tenho vindo a alertar publicamente, estamos numa encruzilhada que exige uma reflexão profunda sobre o futuro da previdência dos Advogados e Solicitadores portugueses, porque a atual situação não se pode manter.
A CPAS enfrenta um ponto de inflexão: ou se reforma para oferecer maior assistência aos beneficiários, quer na doença, quer noutras situações de carência, ou a migração para a Segurança Social torna-se inevitável. No entanto, é essencial enfatizar que qualquer transição deve ser feita com plena consciência das implicações. Defendo firmemente que os Advogados devem ter liberdade de escolha quanto ao seu sistema de previdência, mas é imperativo que essa escolha seja baseada em informações claras e completas. Um ponto crítico que tenho destacado é a insustentabilidade da atual taxa de incumprimento das contribuições para a CPAS, que ronda os 21%.
Este nível de incumprimento compromete seriamente a sustentabilidade do sistema e a capacidade de garantir reformas dignas no futuro. Tenho proposto a consideração de um modelo híbrido como uma possível solução. Este modelo poderia oferecer uma proteção mais robusta e adaptada às necessidades específicas da Classe, assentando em três pilares fundamentais: proteção na velhice, proteção na perda de rendimentos e proteção na doença. Esta abordagem visa transcender as limitações inerentes tanto à CPAS como à Segurança Social. Quanto à resolução desta questão durante o atual mandato do Conselho Geral, é difícil prever com certeza. A complexidade do tema e a necessidade de um debate amplo e informado sugerem que uma solução definitiva pode não ser alcançada no curto prazo. O futuro da Advocacia portuguesa depende das decisões que tomarmos hoje sobre a nossa previdência e é nossa responsabilidade assegurar que essas decisões sejam as mais informadas e benéficas possíveis para toda a Classe.
Como avalia a questão das defesas oficiosas e as negociações que estão a ser feitas pela OA e Governo?
A questão das defesas oficiosas em Portugal continua a ser um ponto nevrálgico para a Advocacia, exigindo uma análise crítica e uma ação decisiva. A situação atual, com uma tabela de pagamentos inalterada há mais de 20 anos, representa uma injustiça flagrante para os Advogados que prestam este serviço essencial. Contudo, observam-se alguns sinais positivos. Por um lado, e como já referido anteriormente, o Ministério da Justiça iniciou um processo de revisão da tabela de honorários no Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais (SADT).
Infelizmente, a proposta de revisão da tabela de honorários apresentada pelo MJ não é conhecida, o que impede um debate informado dentro da classe. A abordagem atual parece contribuir para uma polarização excessiva e contraproducente entre a Ordem dos Advogados e o Ministério da Justiça. Esta dinâmica de confronto constante não só dificulta o diálogo necessário, mas também compromete a eficácia na resolução dos problemas urgentes que afetam a Advocacia portuguesa.
Uma estratégia mais equilibrada e colaborativa, baseada em negociações fundamentadas e propostas concretas, poderia ser significativamente mais benéfica para alcançar os objetivos desejados. Esta abordagem construtiva não implica ceder em questões fundamentais, mas sim buscar soluções inovadoras e mutuamente aceitáveis que possam fortalecer o sistema judicial como um todo.
A resolução satisfatória da questão das defesas oficiosas é fundamental não apenas para a dignidade da Advocacia, mas para garantir o acesso à justiça para todos os cidadãos. Tal só será possível se a OA adotar uma postura mais equilibrada e transparente durante este processo, comunicando de forma clara e regular com os seus membros.
O Ministério da Justiça deve reconhecer a urgência da situação e agir de forma decisiva para implementar as mudanças necessárias. É fundamental a divulgação da proposta de revisão da tabela apresentada pelo MJ, permitindo um debate informado dentro da Classe.
Por último, deve ocorrer um diálogo mais construtivo entre a OA e o MJ, focado em soluções concretas e não em confrontações públicas, para se conseguir uma solução que beneficie não apenas os Advogados, mas toda a sociedade portuguesa.
Pretende candidatar-se a bastonário?
Neste momento, a minha prioridade e foco estão inteiramente direcionados para as minhas responsabilidades como Presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados.
Tenho ainda um ano de mandato pela frente, um período durante o qual pretendo concretizar diversas iniciativas, ideias e projetos que considero fundamentais para o fortalecimento da Advocacia na circunscrição territorial do CRLisboa. Estou rodeado por uma equipa coesa e dedicada e juntos temos ainda muitos desafios pela frente.
O nosso compromisso é continuar a trabalhar para melhorar as condições de exercício da profissão, promover a formação contínua e defender os interesses dos Advogados.
Queremos continuar a desenvolver ferramentas de apoio ao trabalho dos Colegas, aprofundar a digitalização dos nossos serviços, expandir as nossas ofertas de formação e manter uma voz ativa na defesa dos interesses da Classe, especialmente em questões críticas como a necessidade de revisão dos nossos Estatutos e a melhoria do sistema de apoio judiciário.
A questão de uma eventual candidatura a Bastonário é algo que, neste momento, não está no horizonte das minhas preocupações imediatas. O meu compromisso é com o presente e com as responsabilidades que assumi perante os Advogados de Lisboa. Qualquer consideração sobre futuros cargos ou posições seria, neste momento, prematura e desviaria o foco do trabalho importante que temos pela frente no CRLisboa.
Que desafios enfrentam os advogados mais jovens no mercado de trabalho?
Os desafios enfrentados pelos advogados estagiários e pelos advogados mais jovens no mercado de trabalho são múltiplos e complexos, agravados pelas recentes alterações aos estatutos e ao regime de estágio.
Embora haja uma intenção de melhorar a formação e as condições, algumas mudanças têm gerado preocupações: A redução do estágio de 18 para 12 meses é um ponto controverso. Enquanto alguns argumentam que 12 meses são insuficientes para uma formação adequada, outros defendem que este período pode ser suficiente se bem estruturado.
A obrigatoriedade de remuneração, embora bem-intencionada, está a limitar as oportunidades de estágio, especialmente em escritórios menores ou com advogados em prática individual.
É essencial que o estágio prepare os jovens Advogados para as mudanças tecnológicas e as novas exigências da Advocacia. A chave para um estágio eficaz está em encontrar o equilíbrio certo entre duração, conteúdo teórico e prático, e as necessidades do mercado, garantindo que os jovens Advogados estejam bem preparados para enfrentar os desafios da profissão no século XXI.
Só assim poderemos garantir que o talento e a vocação, e não apenas as circunstâncias financeiras ou as conexões, determinem quem pode seguir uma carreira na Advocacia em Portugal.
De que forma é que o CRLisboa ajuda a jovem advocacia?
O CRLisboa tem desenvolvido um conjunto abrangente de iniciativas para apoiar os Advogados mais jovens, incluindo um programa muito amplo de ações de formação gratuitas, reconhecendo os desafios únicos que enfrentam no início de suas carreiras.
Estas formações visam preencher lacunas entre a educação académica e as necessidades práticas da profissão.
Temos vindo a produzir regularmente publicações, newsletters, podcasts e outros suportes informativos e formativos, fornecendo informações atualizadas sobre legislação, jurisprudência e práticas profissionais.
Temos disponibilizado plataformas digitais que facilitam e aceleram o trabalho dos jovens Advogados, ajudando-os na sua adaptação às exigências tecnológicas da profissão. Temos estabelecido protocolos e parcerias com universidades e serviços públicos, ampliando as oportunidades de aprendizagem para jovens Advogados.
Temos vindo a disponibilizar gratuitamente balcões e outros canais online para acelerar e facilitar o trabalho dos Colegas, oferecendo suporte prático em questões do dia-a-dia profissional.
O CRLisboa tem atuado na defesa dos interesses da Classe, particularmente em questões que afetam diretamente os jovens Advogados, como as alterações aos estatutos e ao regime de estágio.
O CRLisboa tem promovido iniciativas de diálogo, reflexão e estudo, incluindo debates e esclarecimentos com partidos políticos, visando, nomeadamente, melhorar as condições para o exercício da jovem Advocacia.
Estas iniciativas demonstram o compromisso do CRLisboa de proporcionar um apoio abrangente à jovem Advocacia, reconhecendo o seu papel fundamental no futuro da profissão e visando facilitar a sua integração e sucesso no mercado jurídico.
O CRLisboa tem vindo a assumir-se como um prestador de serviços aos Advogados, criando uma rede de apoio especialmente importante para os Advogados em prática individual, sem custos para a Classe.
O seu processo disciplinar está em andamento. Como acha que o mesmo pode afetar a sua prestação enquanto dirigente da OA?
Este processo, que foi recentemente arquivado pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados, refere-se apenas a uma das participações apresentadas pelo Conselho Geral contra mim.
Entendo que estas participações visam condicionar a minha atuação e a atuação do Conselho Regional de Lisboa e são motivadas por uma clara animosidade e desconforto por parte do Conselho Geral perante as posições que tomo em nome desse Conselho.
No entanto, o arquivamento deste processo em particular veio fortalecer significativamente a posição dos Conselhos Regionais dentro da estrutura da Ordem dos Advogados para além de, obviamente, reforçar apenas a legitimidade das ações tomadas enquanto Presidente do CRLisboa.
A decisão do Conselho Superior é particularmente importante por dois motivos fundamentais: o Conselho Superior reconheceu e reafirmou o princípio da separação de poderes na orgânica interna da Ordem. Isto significa que cada órgão, incluindo os Conselhos Regionais, tem a sua esfera de competências próprias e independentes. A decisão veio confirmar e fortalecer as competências próprias do Conselho Regional de Lisboa.
Ficou claro que as ações realizadas estavam dentro das atribuições do CRLisboa, nomeadamente no que diz respeito à celebração de protocolos e à gestão das suas atividades. Quanto à minha prestação como dirigente da OA, longe de ser afetada negativamente, sinto-me fortalecido por esta decisão.
Ela confirma que tenho agido dentro dos limites legais e éticos da minha função, sempre em prol dos interesses dos Advogados que o CRLisboa representa.
Estes processos, embora desgastantes, não me desviam, nem ao Conselho Regional, do nosso compromisso: trabalhar para melhorar as condições de exercício da Advocacia, defender os interesses dos Advogados e promover uma Ordem dos Advogados mais transparente, eficiente e ao serviço dos seus membros.
Continuarei a exercer as minhas funções com a mesma dedicação e integridade, certo de que estou a agir corretamente e dentro das competências que me são atribuídas pelo Estatuto da OA.
E o processo disciplinar que ainda está a decorrer?
Não posso responder sobre eventuais processos em curso sobre mim.
Que balanço faz – de forma resumida – do seu mandato no CRLisboa?
O nosso mandato no CRLisboa tem sido verdadeiramente desafiante e repleto de realizações. Temos trabalhado incansavelmente para consolidar e expandir as ferramentas de apoio aos nossos Colegas, sempre com o objetivo de melhorar as condições de exercício da profissão. Um dos nossos principais focos tem sido a criação de uma rede integrada de apoio aos advogados, que combina formação contínua com recursos práticos e suporte profissional, de forma gratuita. Esta abordagem holística tem sido particularmente benéfica para os Advogados mais jovens e para os Advogados em prática individual.
Na área da formação, demos passos significativos:
– expandimos consideravelmente a nossa oferta de ações formativas, realizando 70 ações de formação contínua em 2023, com 25.213 inscrições.
– organizámos 11 ações de formação em áreas complementares para Advogados Estagiários, com 486 inscrições.
– estabelecemos parcerias estratégicas com universidades e serviços públicos, ampliando as oportunidades de aprendizagem e networking.
A digitalização dos serviços tem sido outra prioridade. Implementámos novas plataformas digitais e canais de atendimento que facilitam e aceleram o trabalho dos Advogados, adaptando o CRLisboa às exigências tecnológicas da profissão no século XXI.
Um marco importante do nosso mandato foi o lançamento do Gabinete de Promoção do Bem-Estar Psicológico (GaBEP) em novembro de 2022. Esta iniciativa pioneira já realizou 420 consultas e 100 triagens, tornando-se um recurso vital para abordar as questões da saúde mental na Advocacia.
Mantivemos uma postura ativa na defesa dos interesses da Classe, especialmente em questões críticas como o impacto da Lei das Associações Públicas Profissionais (LAPP) e as alterações aos Estatutos da Ordem. Promovemos debates, esclarecimentos e diálogos intensos com partidos políticos e outras entidades relevantes. Também nos posicionámos de forma responsável em questões financeiras. Decidimos abdicar das senhas de presença para os membros do CRLisboa, uma medida que visa preservar a sustentabilidade financeira da Ordem.
Em resumo, considero que temos cumprido a nossa missão de forma diligente e inovadora, sempre com o foco em servir e fortalecer a Advocacia.
Apesar dos obstáculos, continuamos comprometidos em defender a dignidade da profissão e em criar melhores condições para o exercício da advocacia, posicionando o CRLisboa como um verdadeiro prestador de serviços aos Advogados.
E do mandato do CG?
O mandato do atual Conselho Geral tem suscitado preocupações significativas, não apenas no âmbito da gestão financeira e das decisões estratégicas tomadas, mas também no que concerne à transparência e ao pluralismo dentro da Ordem.
É preocupante a tentativa de limitar o diálogo interno, com o que poderemos afirmar serem na prática perseguições a Advogados e, por exemplo, jornalistas que divergem das posições oficiais e o bloqueio de comentários nas plataformas de redes sociais da Ordem.
Esta abordagem não só compromete a diversidade de opiniões essencial para uma instituição como a OA, como também levanta questões sobre o compromisso do CG com os princípios democráticos e a liberdade de expressão que deveriam ser fundamentais numa organização que representa a Classe dos Advogados.
A decisão de adquirir um novo imóvel no valor de 3,4 milhões de euros é particularmente preocupante. O financiamento desta aquisição através de um empréstimo bancário com a duração de 15 anos compromete as receitas futuras da Ordem durante uma década e meia, numa época de incerteza financeira. A implementação de remunerações e senhas de presença para membros dos órgãos da Ordem, incluindo os novos órgãos criados, aumenta significativamente as despesas estruturais num momento de potencial redução de receitas.
A abordagem do Conselho Geral em relação a questões fundamentais para a Classe, como as alterações estatutárias e as relações com o Ministério da Justiça, tem sido marcada por uma postura de confronto que nem sempre tem produzido resultados positivos para a Classe.
É fundamental que haja uma mudança de rumo, com foco na sustentabilidade financeira, transparência nas decisões e uma abordagem mais colaborativa e construtiva na defesa dos interesses da Advocacia portuguesa.
O CRL da OA e o CG têm estado em guerra aberta. Essa postura é a mais correta na defesa dos advogados?
É importante esclarecer que esta situação não resulta de uma postura beligerante por parte do CRLisboa, mas sim de uma necessidade de defesa das suas competências estatutárias e da autonomia dos órgãos regionais, já referida anteriormente.
O CRLisboa tem sido forçado a agir em defesa das suas atribuições e da sua autonomia, face a ações do CG que consideramos ultrapassarem as suas competências e violarem o princípio da separação de poderes dentro da orgânica da Ordem.
Um exemplo claro disso foi a questão do protocolo celebrado entre o CRLisboa e a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que gerou um conflito com o CG e resultou até numa participação disciplinar contra mim, a qual foi recentemente arquivada pelo Conselho Superior.
Não obstante, mantenho a firme convicção de que a união da classe é fundamental para enfrentar os desafios que a Advocacia portuguesa enfrenta atualmente.
A nossa postura é de defesa firme dos princípios estatutários e da autonomia regional, essenciais para o bom funcionamento da Ordem e para a defesa eficaz dos interesses dos Advogados, e por isso criticamos de forma veemente a política de radicalização e centralização que tem sido adotada pelo CG. Os outros pontos de confronto prendem-se com visões diferentes, nomeadamente sobre a sustentabilidade financeira da Ordem.
Mas este confronto de ideias é natural e salutar em democracia. A intenção é defender o interesse comum da Classe e é natural que tenhamos perspetivas diferentes sobre certas questões. Acredito que um trabalho construtivo, que respeite as competências de cada órgão e que não seja contra os associados ou contra tudo e todos, é o caminho mais correto para defender os interesses das Advogadas e dos Advogados. Acreditamos que é possível e necessário encontrar um equilíbrio entre a defesa firme dos princípios e uma colaboração construtiva entre os órgãos da Ordem, para o bem da Classe e da Justiça em Portugal.