A imigração é um fator crucial para o desenvolvimento económico e social de Portugal, e a incapacidade de gerir adequadamente esse processo pode ter consequências de longo prazo para o país.
A criação da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), destinada a substituir o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), prometia modernizar e humanizar os serviços de imigração em Portugal.
No entanto, meses após a sua implementação, o que vemos é uma transição conturbada e cheia de problemas, expondo uma realidade bem distante das promessas iniciais.
Uma herança pesada
A AIMA iniciou as suas atividades com um legado crítico do SEF: cerca de 410 mil processos pendentes. Essa pesada herança, combinada com a falta de preparação adequada para a transição, resultou num cenário caótico que afeta milhares de imigrantes em Portugal. Longos tempos de espera, que frequentemente ultrapassam um ano apenas para agendamentos simples, são um reflexo claro da ineficiência do sistema.
Recursos Humanos em colapso
A escassez de recursos humanos é um dos maiores desafios da AIMA. A agência começou as suas operações com apenas 41% do contingente previsto de funcionários. Essa falta de pessoal, aliada a sistemas tecnológicos obsoletos e problemas de infraestrutura, cria um constrangimento significativo no processamento dos pedidos e na prestação de serviços essenciais.
Burocracia: um obstáculo persistente
A burocracia excessiva, uma herança do sistema anterior, continua a ser um grande entrave. A complexidade dos processos e a falta de clareza nos procedimentos não só dificultam a vida dos imigrantes, mas também sobrecarregam os funcionários da agência.
A transferência de algumas responsabilidades para o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) não resolveu o problema, apenas o deslocou, perpetuando atrasos e frustrações.
Impacto internacional
O impacto dessa situação ultrapassa as fronteiras portuguesas. A imagem de Portugal como um país acolhedor e aberto à imigração está seriamente comprometida.
As longas esperas e a incerteza quanto ao estatuto legal estão a empurrar muitos imigrantes para a porta de saída, o que pode ter consequências negativas para a economia portuguesa, que depende significativamente da mão de obra estrangeira em diversos setores.
Exemplos de impacto real
A situação chegou a um ponto crítico em que, por exemplo, as pessoas aguardam mais de dois anos apenas para efetuar o pagamento necessário para a emissão dos títulos de residência. Em alguns casos, agregados familiares inteiros enfrentam uma espera superior a dois anos para entregar ao Estado quantias que ultrapassam os 40.000 euros.
Esta realidade destaca de forma dramática a gravidade da crise e a necessidade urgente de reformas eficazes.
Ação urgente necessária
É crucial reconhecer que a transição do SEF para a AIMA foi mal-executada e que medidas urgentes são necessárias para corrigir o curso. O Governo português precisa de agir rapidamente para resolver os problemas estruturais da agência.
Isso inclui um aumento significativo no número de funcionários, investimentos em tecnologia e infraestrutura, e uma revisão completa dos processos burocráticos para torná-los mais eficientes e transparentes.
Coordenação e gestão eficaz
Além disso, é fundamental uma maior coordenação entre a AIMA e outros órgãos governamentais envolvidos no processo de imigração. A criação da Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros é um passo na direção certa, mas a sua eficácia ainda precisa de ser comprovada no terreno.
Prioridade nacional
Por fim, é essencial que o Governo português reconheça a gravidade da situação e a trate como uma prioridade nacional. A imigração é um fator crucial para o desenvolvimento económico e social de Portugal, e a incapacidade de gerir adequadamente esse processo pode ter consequências de longo prazo para o país.
Um futuro ainda possível
A transição do SEF para a AIMA foi uma oportunidade perdida para melhorar significativamente o sistema de imigração português. No entanto, ainda há tempo para corrigir o curso. Com vontade política, investimentos adequados e uma abordagem centrada nos direitos e necessidades dos imigrantes, é possível transformar a AIMA na agência eficiente e humana que Portugal necessita e merece.
In Jornal Económico em 1 de Julho de 2024